domingo, 6 de junho de 2010

PATRÍCIA

- Patrícia tu não és minha irmã, mas sabes que te vejo como tal. És a minha melhor amiga, sabes perfeitamente disso. E o que te digo, por muito que te custe ouvir, é apenas e somente para teu próprio bem. - Diz-me a Paula.
O João está a brincar. Aquele baloiço ferrugento para o qual os meus olhos são arrastados a cada cinco minutos.
É meu sobrinho, filho do meu irmão. O irmão que eu deixei de conhecer à tanto tempo.
- O facto de eu não querer casar não quer dizer que eu não o ame Paula - Digo já farta do tal assunto. Inspiro fundo e ganho forças para continuar a falar, e apenas dizer aquilo que já repeti mais de cinquenta vezes. - Quer apenas dizer que eu ainda não estou preparada para casar.
O casamento!
Credo!
Eu ainda sou tão nova. Porque têm que me empurrar para algo que eu não quero? E. sinceramente, o que vai mudar se casar agora? Eu vivo com o Pedro. Casar é apenas um monte de papelada sem nexo.
- Mas ele quer casar contigo. Já fez o pedido três vezes Patrícia... - Olha para mim directamente nos olhos, preparando-se para dizer algo muitíssimo importante, como se fosse a chave para eu mudar de ideias. - E em público Patrícia. - O João continua a brincar. Por momentos apago-me desta conversa chata sobre o que eu hei ou não de fazer, como se fossem os outros que tivessem que tomar as minhas decisões. Olho mais atentamente para o meu sobrinho, e sorriu. É igual ao pai quando pequeno. Os cabelos finos e lisos, quase brancos, os olhos tão azuis como céu, o sorriso brilhante, o ar inocente. Lembro-me do Afonso assim, quando me protegia dos outros, e essa recordação aparece-me tão distante, que até penso se será um sonho. A Paula fala mais alto, certa de que a deixei de ouvir, e, de repente, sou de novo empurrada para a minha estúpida realidade. - O teu irmão tem razão, olha o que as pessoas vão pensar.
E aquelas palavras espetam-se no meu peito como facadas.
Olho-a nos olhos.
São brilhantes, verdes. As pestanas tão perfeitamente enroladas pelo rimel. A sombra que combina tão perfeitamente com a roupa e, por um instante, toda aquela combinação de perfeição mete-me nojo.
- Como - Pergunto tentando controlar a voz. - Mas como, é que és capaz de dizer uma coisa dessas?
Os olhos dela, compreensivos e tão inocentes, quase que me embalam, num acto de amor e compaixão que eu não queria nem precisava.
- Eu sei que não gostas que te digam isto mas... tens que pensar mais ...
- No que as outras pessoas pensam de mim? - Interrompo-a. ela olha-me espantada, certamente não esperando esta minha reacção tão explosiva. - Paula se não tens nada de jeito para dizer bem podes dar duas voltas e ir embora.
Ela olhou para mim, mais uma vez compreensiva, no entanto, tanto eu como ela, sabíamos que por muito que eu ripostasse, a minha vontade não iria ser ouvida.

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